A tristeza vem e come a gente pelas bordas

Primeiro vem a dor. Uma mulher espalhafatosa, usa roupas chamativas, batom vermelho, decotes imensos, chama a sua atenção. Precisa que olhem para ela. Exigem que olhem.

E olhamos.

Elá dá o seu melhor sorriso e nos toma de assalto.
É uma vaca, essa dor!
Vira nosso mundo de cabeça para baixo, chacoalha tudo, e quando ela toma conta, entra dentro de nós. Você consegue perceber ela ali. O seu risinho retumba dentro de você, mas o que você sente é aquela coisa densa, querendo explodir ali dentro. Uma bomba barulhenta. Ou uma silenciosa, que você sabe, hora ou outra explode. Se você um dia chegar perto de uma caixa de abelhas vai entender o que eu digo. Fica aquele riso zunindo, um barulhinho baixo, mas potente. Você abre a boca e as abelhas saem, atropelando umas as outras. Pode ser em forma de choro, de raiva, ou simplesmente dor. As vezes é até um urro desesperado, tentando jogar a maldita para fora de uma vez.

Bem, mas a dor é uma mulher muito volúvel, sabe? Se interessa por você, fica um tempo e embora.
Só que ela comenta de você com as amigas. Logo vem uma delas atrás de você.

A tristeza chega de mansinho. Elá é caladona, silenciosa, fica só te olhando. E chega junto, fica pertinho, bem pertinho de você. Enquanto isso você vai tocando a sua vida, mas ela esta ali. Quando você olha no espelho, as pontas dos seus dedos estão comidas. As pontas dos pés tamém. Se pudesse olhar dentro de você, veria que o fígado, o pulmão, estão comidos também. Mas o que foi mais abocanhado foi o coração. Esse coitado, tem só um toquinho, que fica batendo só para te manter de pé.

E você achando que está tudo bem, afinal ninguém dá bola para a tristeza. Mas ela tá ali, e continua roendo você, cada vez mais. Um dia você se liga e vê... que a tristeza te comeu quase inteiro. Ela continua do seu lado, mas está de barriga cheia, com cara de sacana, palitando os dentes, pensando em comer com um pouco mais de cautela. Esperando crescer mais alguma coisinha onde ela já roeu.. para roer de novo.

Você percebe que virou um zumbi. Anda por aqui e por ali como uma alma penada, fazendo tudo no automático. Afinal de contas, não existe nada para fazer além do automático. A tristeza comeu aquela parte que você talvez apelidava de "prazer". Comeu e lambeu os dedos. Você até tenta, inventa coisas novas para fazer, tenta se divertir. Mas até nessas tentativas, está no automático. Na verdade, se for pensar bem no assunto, a vontade é fazer um iglu de cobertores em sua cama e não sair mais de lá, alternando entre períodos (grandes) de sono e apatia. Lá longe você ouve a risada da dor dar uma retumbadinha, claro, bem informada ela sabe, e sabe de tudo.

Então você olha para o lado, fita os olhinhos miúdos e molhados da tristeza e pergunta: Até quando você vai ficar por aqui? Já não devorou tudo o que havia em mim?

Ela diz que não sabe. Afinal de contas, ela gosta até das sobras.

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